segunda-feira , 3 novembro 2025
| Cidade Manchete
Lar Economia como a guerra afeta a produção agrícola brasileira
Economia

como a guerra afeta a produção agrícola brasileira


Para além das consequências geopolíticas, a guerra entre Israel e Irã, que entrou em seu quinto dia nesta terça-feira (17), tem gerado forte repercussão nos mercados internacionais, acendendo um alerta para o agronegócio brasileiro. A continuidade por longo prazo ou uma possível escalada dos ataques deve ter como consequência direta o aumento nos custos de produção da agricultura nacional. 

Uma das maiores preocupações é com relação ao mercado de ureia, principal fertilizante à base de nitrogênio utilizado na agricultura e do qual o Irã é um dos mais importantes fornecedores globais. 

No ano passado, 19% de todo o composto importado pelo Brasil teve origem iraniana, o equivalente a 1,6 milhão de toneladas das 8,3 milhões de toneladas compradas pelo Brasil no exterior, segundo a empresa de consultoria Argus. 

“Esse aspecto é particularmente sensível porque estamos em um período em que nem todos os insumos da safra 2025/26 foram adquiridos”, diz o economista Felippe Serigati, coordenador do Mestrado Profissional em Agronegócio do FGVAgro. “Dependendo da situação é bastante razoável que o pessoal antecipe as compras dos fertilizantes que vão ser utilizados na safrinha de 2026.” 

Além de chegar mais cara, diz o economista, é possível haver uma dificuldade de haver abastecimento total de ureia para todo o país. 

VEJA TAMBÉM:

Renata Cardarelli, especialista em agricultura e fertilizantes da Argus, explica que as incertezas com relação à disponibilidade global do nitrogenado e a potencial restrição na oferta já fizeram muitos participantes se retirarem do mercado físico.

Na última quinta-feira (12), o preço médio de ureia granulada importada pelo Brasil estava em US$ 398 por tonelada (incluindo frete). O mercado estava com baixa liquidez porque aguardava os desdobramentos de um leilão da Índia para compra do produto. 

Na sexta-feira (13), com as tensões entre Israel e Irã, o leilão acabou em segundo plano, e o preço médio subiu para US$ 430 por tonelada. Na segunda (16), o ponto médio da faixa diária da Argus ficou em US$ 435, acompanhando a alta registrada no mercado de papel e com participantes ausentes do mercado físico. 

A alta acumulada desde o início do conflito é de 9,3%. 

O Oriente Médio é o principal exportador global de ureia, embarcando cerca de 20 milhões de toneladas por ano, com o Irã representando 25% desse total. A produção total do nitrogenado no Irã é estimada em cerca de 9 milhões de toneladas por ano.

VEJA TAMBÉM:

Brasil importa cloreto de potássio de Israel

O Brasil também importa fertilizantes de Israel, principalmente cloreto de potássio, embora neste caso o impacto não deva ser tão significativo. Em 2024, Israel foi o quarto principal fornecedor de fertilizantes potássicos para o Brasil, com cerca de 1 milhão de toneladas embarcadas. 

A Rússia liderou as exportações de potássicos para a agricultura brasileira, com 5,4 milhões de toneladas, seguida pelo Canadá (4,9 milhões de toneladas) e o Uzbequistão (1,4 milhões de toneladas). 

“Mesmo quando teve início o conflito israelense com o Hamas, em outubro de 2023, que poderia provocar algum problema para acessar os portos do país via Mediterrâneo, não tivemos grandes problemas”, explica Serigati.

Irã é importante destino do milho brasileiro

Na via contrária, o Irã é ainda um importante comprador de milho brasileiro. A continuidade ou a escalada da guerra na região também tende a prejudicar esse comércio.

Em 2024, o Brasil vendeu para o mercado iraniano 4,3 milhões de toneladas do grão, cerca de 10% de todo o milho exportado. As vendas para o Irã, terceiro maior comprador do produto brasileiro, atrás de Egito e Vietnã, somaram US$ 918,4 milhões. 

“Não acho que vá alterar o preço, porque a gente não tem muita folga nesse mercado por causa da demanda interna de milho para ração e para a produção de etanol”, avalia o professor da FGV. “Mas um trader que tenha um contrato com o Irã como destino pode ter dor de cabeça.”

Alta do petróleo encarece frete e maquinário agrícola

Uma das principais consequências de um prolongamento do conflito, no entanto, deve ser no preço do petróleo, que afeta todas as culturas, algumas mais ou menos diretamente. A região do Oriente Médio é uma das principais produtoras do combustível fóssil, e qualquer tensão influencia nos preços em razão dos riscos associados ao fornecimento do produto. 

O início da guerra entre Israel e Irã fez a cotação do barril Brent saltar de US$ 69,36, na quinta-feira, para US$ 74,75 (+7,77%) no dia seguinte. Na segunda-feira (16), os preços recuaram após notícias de que o Irã estaria buscando negociações com os Estados Unidos para que o país pressione Israel a um cessar-fogo. 

O aumento no preço do óleo diesel influencia diretamente o custo do maquinário agrícola. E produtos que concorrem diretamente com derivados do petróleo tendem a ficar mais caros. “Se a fibra sintética fica menos competitiva, por exemplo, isso tende a puxar o preço do algodão para cima”, explica Serigati. 

Além disso, uma disparada no petróleo encareceria o frete tanto do transporte rodoviário quanto do transporte marítimo, afetando diretamente os custos de importação, exportação, produção e distribuição.

Risco de necessidade de desvio de rota encareceria ainda mais o frete marítimo

Uma das grandes preocupações no mercado global é a possível necessidade de desvio de rotas, especialmente caso o Irã decida bloquear o Estreito de Ormuz, uma pequena faixa de água que liga o Golfo Pérsico ao mar aberto. 

O canal é fundamental para as exportações de petróleo e gás natural do Oriente Médio para o restante do mundo. Segundo a Administração de Informação e Energia dos Estados Unidos, cerca de 20 milhões de barris de petróleo passam pelo estreito diariamente. 

Para o comércio exterior brasileiro, proteínas animais que são comercializadas para o Oriente Médio poderiam ter alguma dificuldade para atender o mercado da região, embora nem o Estreito de Ormuz nem o Canal de Suez, no Mar Vermelho, sejam as principais rotas.

O problema é que a necessidade de um desvio de rotas no fluxo comercial global aumenta os preços do frete e do seguro marítimo de forma geral. “Não é nem uma questão de combustível, mas o mercado de frete ter de se reorganizar tem efeitos para todo mundo”, afirma Serigati. 

Efeitos do conflito entre Israel e Irã sobre inflação de alimentos são incertos

Ainda é cedo para avaliar a forma como o aumento dos custos de produção deve chegar no prato de comida. Serigati explica que a transmissão dos custos do campo para o preço dependerá muito da produtividade.

“A gente passou por uma guerra na Ucrânia que jogou o preço do fertilizante lá em cima, houve um esforço monumental para trazer cloreto de potássio e nitrogenados de onde era possível, inclusive do Irã. E fizemos uma supersafra em 2023”, recorda.

Câmbio não é a maior preocupação

Com relação ao câmbio, as projeções ainda são incertas. Embora em geral guerras levem investidores a buscarem posições em dólar americano, nos últimos anos a segurança associada a títulos dos Estados Unidos tem se reduzido.

“Se o pessoal perceber que, apesar do risco, a coisa não vá escalar nos próximos seis meses, vão olhar antes para os nossos juros reais, que estão rodando próximo de 9%”, diz o economista. 

Na segunda-feira (16), a moeda americana encerrou o pregão cotada a R$ 5,487, renovando o menor patamar de fechamento desde 7 de outubro do ano passado. 



Source link

Deixe um comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Artigos relacionados

Economia

Receita aperta o cerco ao aluguel com “CPF dos imóveis”

A Receita Federal intensifica o cerco à informalidade no mercado imobiliário com...

Economia

o cerco da Receita a aluguéis informais

A partir de 2026, proprietários que alugam imóveis informalmente enfrentarão um cerco...

Economia

China vai dar autorização especial ao Brasil para imporat chips

Fabricantes brasileiros do setor automotivo poderão receber uma autorização especial do governo...

Economia

Brasil deve propor aumento de fluxo comercial em acordo com Trump

O governo Lula discute internamente que propostas pode fazer a Donald Trump...