Milton Nascimento foi indicado ao Grammy, mas teve seu lugar entre os grandes apagado. Não foi barrado, mas foi tratado como um figurante na própria premiação. Sua parceira de álbum, Esperanza Spalding, foi acomodada entre os artistas principais. Milton, uma das maiores lendas da música mundial, recebeu um assento na arquibancada—como se fosse um espectador qualquer. Motivo? A organização disse que “nas mesas ficariam apenas os artistas que eles queriam no vídeo”. Isso mesmo. O Grammy selecionou quem ficaria no enquadramento das câmeras, e Milton Nascimento, a voz que revolucionou a MPB, não estava na lista.
O episódio é uma prova do que já sabemos há tempos: o Grammy não entende a música brasileira. Não entendeu quando deu o prêmio a “Getz/Gilberto” em 1965, mas ignorou Tom Jobim e João Gilberto na cerimônia. Não entendeu quando premiou Sérgio Mendes em 1993, mas nunca reconheceu a grandiosidade de Cartola, Clementina de Jesus ou Luiz Gonzaga. Agora, ignora Milton. E o Brasil, como sempre, se indigna. Se revolta. Mas será que ainda faz sentido esperar reconhecimento de um evento que sequer respeita a trajetória de um dos maiores músicos da história conhecido como “a voz de Deus”?
O Brasil vive essa relação tóxica com o reconhecimento internacional. No mesmo Grammy, Anitta perdeu na categoria de Música Urbana. No Oscar, Ainda Estou Aqui, de Walter Salles, fez história ao ser o primeiro filme brasileiro indicado na categoria de Melhor Filme Internacional e também na categoria principal de Melhor Filme. Uma conquista, sem dúvida. Mas no fundo, sempre ficamos com a sensação de que fomos “lembrados”, não que ocupamos um espaço por direito. Nossa cultura é sempre tratada como exótica, algo que pode ou não ser aceito no banquete do mainstream global.
Enquanto o Grammy e o Oscar nos esnobam, o Brasil despeja rios de dinheiro em bandas decadentes internacional. Turnês e festivais estrangeiros dominam o mercado, com ingressos que variam entre R$ 500 e R$ 1.300. No final do mês, ninguém tem dinheiro para pagar R$ 50 para ver um artista nacional num espaço independente. A indústria funciona assim: nos ensina a idolatrar o que vem de fora, faz do show gringo um evento obrigatório, enquanto o artista brasileiro é tratado como entretenimento de segunda classe.
Mas essa invasão de espetáculos importados não é só uma coincidência. É um projeto. Grandes shows internacionais são braços do mercado ditando o que devemos ouvir, onde devemos gastar e, principalmente, quem devemos esquecer. Enquanto o Brasil gasta milhões para ver um popstar norte-americano que estará de volta no ano seguinte, nossos artistas lutam para sobreviver. Enquanto a gente esgota ingressos para ver um show genérico importado, um artista brasileiro fecha as portas de um espaço cultural porque não consegue cobrir os custos de uma turnê.
O Grammy não merece Milton. O Oscar não define nosso cinema. E esses festivais gringos não podem ser mais importantes do que os artistas locais. Nossa música e nosso audiovisual já são gigantes por si só. Mas enquanto insistirmos em validar nossa arte pelos olhos de fora, continuaremos compactuando com esse apagamento. E não, não é para pedir respeito.
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